sexta-feira, 20 de junho de 2014

A "descoberta"

Olá =D . Hoje vou escrever sobre o terceiro tópico do questionário. "Quantos anos eu tinha quando "descobri" minha asexualidade e o que me fez percebê-la?"

   É engraçado lembrar disso agora que já passou tanto tempo, na época não foi nada engraçado. Acredito que  você meio que sempre sabe o que te interessa, mas tudo começa mesmo a acontecer na puberdade. Por volta dos quatorze, quinze anos... Que é quando o assunto da virgindade começa a acender nas rodas de conversa (como uma coisa ruim, claro) e que começam a aparecer os traços de sexualidade. Pessoas se interessando por pessoas, pessoas falando sobre fazer sexo, sobre quem perdeu e quem não perdeu a virgindade. Quem tá e quem não tá namorando com quem. Foi quando meus primeiros amigos gays saíram de seus armários e quando eu comecei a perceber que existiam diversos "rolês". Tinha o rolê HT (hétero, prxs desinformadxs) e o rolê HM (homo). Eu, particularmente não entendia nada. Mas achava o rolê HM muuuuuuuito mais divertido. As pessoas pareciam mais livres então comecei a andar mais com xs gays e lésbicas da minha cidade. Além disso eu frequentava outros dois espaços majoritariamente héteros. Eu jogava basquete pelo Clube Comary na equipe infantil e frequentava assiduamente o fliperama que ficava no centro da cidade.

   Eu tinha uma namorada na época. Eu não sabia se ela já tinha feito sexo ou não, mas foi ela que me encaminhou nos meandros sexuais. A gente começou a namorar ambos com 14 anos de idade, mas ela já tinha namorado um cara mais velho então tava ligada nuns paranauês que eu não tava. A primeira vez que fui pra casa dela ela me apresentou ao que fui descobrir futuramente que se chamariam preliminares. Antes disso eu apenas tinha fantasiado sobre estar com uma garota (como o mundo me dizia para fazer) mas nunca tinha realmente pensado sobre como seria. Eu lembro da sensação. Eu me divertia porque parecia proibido. Faziamos sempre escondidos, e ficávamos nos tocando e roçando um no outro. Com nossas respectivas roupas (normalmente apenas roupas de baixo). Sem gozar. Eu gostava da tensão do "se alguém chegar e ver a gente fazendo isso". Era um namoro muito bom. Ficamos oito meses juntos e eu acabei terminando com ela porque uma outra garota me tentou dizendo que queria muito fazer sexo comigo por  tempo o suficiente para que eu terminasse. Naquela época eu ainda era virgem (apesar de não admitir) e achava que terminando o namoro seria o jeito mais fácil de me livrar desse "problema".

  Pois bem, terminei o namoro e a tal garota desapareceu. Era pra eu estar decepcionadx com a situação, mas na verdade eu estava bem aliviadx, porque eu não fazia idéia de como ia ser essa coisa de fazer sexo, muito menos sabia se eu realmente queria aquilo. Minhas emoções eram muito conturbadas. Eu não conseguia sentir vontade de fazer sexo, mas eu achava que era porque eu nunca tinha feito e que essa vontade viria depois que o "medo da primeira vez" passasse. Alguns amigos mais próximos me disseram a mesma coisa e eu fiquei pensando quando ia acontecer.

   Após o término desse namoro, entre os 15 e os 16 anos eu conheci uma garota de outra cidade que estava passando o final das férias aqui. Nos conhecemos porque ela estava andando com uma prima minha e elas pediram para eu bater uma foto das duas (nos encontramos sem querer na rua). Na época eu tinha tranças raiz (ou nagô) e ela adorou minhas tranças e meu estilo. Pediu meu telefone para minha prima e quando eu estava de noite no meu quarto ela me ligou, dizendo que era a menina que estava com a minha prima e que queria me ver. A gente se encontrou no dia seguinte e após um pouco de conversa começamos a ficar. Ela era mais nova, acho que tinha acabado de fazer 14 anos, mas tinha saído de um relacionamento com um cara de 18 onde fazia sexo regularmente, então logo o sexo virou um tópico frequente de nossas conversas. Ela queria fazer sexo comigo e ela ia embora no fim da semana, logo: ela queria fazer sexo comigo até o fim daquela semana. Em mim misturavam-se sentimentos de nervosismo, ansiedade e medo e eu realmente não sabia o que dizer. Acabei dizendo que ia dar um jeito. Pois bem. Meus pais costumavam ir todo sábado para o Clube, na parte da manhã e normalmente eu não ia porque eu ficava sexta feira até tarde jogando video game e não conseguia acordar. Esse sábado "não foi diferente", mas eu esperei eles irem embora e liguei para a tal garota e ela veio aqui pra casa. Acho que foi aí que eu percebi que tinha alguma coisa diferente entre eu e os outros meninos.

  Eu via na voz dela que ela estava com muita vontade, ela me jogou na cama e veio se arrastando pra cima de mim e eu só conseguia dizer uma palavra: medo. E era a única palavra que saía da minha boca, repetidas vezes. medo.medo.medo.medo.medo.medo. até que ela parou e me perguntou "medo de que?" e eu disse que não podia fazer aquilo. Ela se sentiu ofendida e foi embora e acabou que nunca mais nos falamos. Eu continuei sem entender nada, mas fiquei me achando um idiota e passei uns bons anos remoendo a "merda que eu tinha feito".

  É engraçado pensar sobre descobrir-se asexual. Não é como ser gay ou lésbica ou bi ou hétero, porque essas pessoas sabem exatamente o que elas querem. Uma pessoa hétero quer fazer sexo com uma pessoa do sexo oposto, um gay busca outros homens, uma lésbica outras mulheres.  Eu, eu buscava boas companhias e a maior distância possível de sexo. E é aí que fica (ficou pra mim pelo menos) muito difícil de se aceitar, se autoafirmar e encontrar uma identidade na qual eu se encaixar. Tentei me relacionar com homens, parece que eu sentia menos tesão ainda do que com mulheres (se é que existe valor menor que 0 para o tesão), não deu certo. Comecei a experimentar meu próprio corpo. Comecei a experimentar masturbação anal pra ver se era a minha praia. Não era, mas eu curti introduzir objetos inanimados no meu ânus por um tempo. Mas minha questão nunca foi se masturbar, ainda gosto de me tocar (tanto pênis quanto ânus). A minha questão era atração sexual por outras pessoas. E esse foi meu maior problema. Eu não tinha. Era o único a minha volta que não estava interessado em fazer sexo com alguém e isso começou a me machucar.

  A pior parte de me sentir assim era que eu acreditava que ninguém me entendia. E foi aí que eu comecei de fato a andar com as lésbicas. Saí do basquete, o fliperama fechou e acabou que meu único lazer era beber com elas e conversar. Era um ambiente ótimo, eu me sentia muito bem e elas nunca se sentiram incomodadas com a minha presença lá. Com o tempo fiz grandes amigas nas quais eu pude confiar e contei para elas sobre a minha situação. Algumas se espantavam outras "desejavam ser assim", mas duas delas (cujo nome ainda não pedi permissão para colocar aqui) foram as que mais me ajudaram. Elas simplesmente disseram, cada uma do seu modo "ué Roque, você só não gosta de sexo. É só isso." Ora, e era realmente "só isso", mas pra mim até aquele momento parecia tanta coisa.

  O termo asexual só veio aparecer muito depois disso. Muito depois de muita coisa, muito depois de quando eu perdi minha virgindade, que foi com 17 anos com uma mulher, numa rua escura e não movimentada, as 20:30h. Era uma quarta feira, ela era minha namorada a menos de um mês e queria muito fazer sexo comigo. Todos os nossos amigos não acreditavam que eu era virgem apesar d'eu ter colocado pra ela isso [mas nunca havia mencionado uma possível asexualidade porque eu estava disposto a tentar novamente]. Finalmente era o momento. Ela com as calças arriadas, eu também, introduzo meu pênis e broxo. Para mim contou como perder a virgindade, para ela não sei. Não pretendo ter essa experiência de novo porque alí tudo ficou claro pra mim. Essa vida de sexo realmente não era pra mim.

  O termo asexual apareceu já na faculdade, mas foi muito depois da "descoberta" (eu prefiro o termo aceitação) de que eu não gostava de sexo. Foi já na faculdade, quando extremamente perdido sobre como me identificar para o mundo (eu costumava dizer que era bisexual, mas não fazia sexo e eu sabia que isso era uma definição errada). que fazendo uma pesquisa na internet sobre minha "bizarra condição" eu descobri a AVEN, que é um núcleo internacional de informações sobre asexualidade, com um fórum internacional e links para vários blogs de pessoas que também se identificavam como asexuais. Foi a primeira vez que senti que existiam pessoas que me entendiam de verdade e com quem eu podia trocar experiências, pra quem eu podia falar abertamente sobre como foram minhas experiências sem sentir necessidade de mentir ou inventar histórias.

  Acho que falar sobre quando eu descobri é separar os momentos em que eu senti que eu não tinha atração sexual por ninguém do momento em que eu admití isso e o momento em que eu finalmente descobri a minha orientação (a)sexual.

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